top of page
Postagens recentes


JAMES BOND NO REINO DA LACRAÇÃO


por Ricardo Corsetti

Realmente, a despedida de Daniel Craig (Entre Facas e Segredos, 2019) do papel do mais famoso espião da história do cinema, merecia um filme melhor. Não que Sem Tempo Para Morrer seja necessariamente ruim. Conforme já era de se esperar, é recheado de cenas de ação de tirar o fôlego. Pena que não muito mais do que isso.

Em termos de roteiro, aliás, embora a trama seja relativamente fluente e clara, algumas escolhas na composição do personagem central são bastante equivocadas, pois houve uma preocupação exagerada e artificial no sentido de readaptar o clássico personagem à correção política que rege o mundo (ou, ao menos, o discurso) contemporâneo. Para tanto, se promoveu uma verdadeira "assexualização" de Bond. Pois, nos dias atuais, parece que sexo virou crime. Por isso mesmo, ao longo de 2 horas e 43 minutos de filme, praticamente não há contato físico entre o agente e as demais personagens da trama, nem mesmo com sua namorada, vivida por Léa Seydoux (Azul é a Cor Mais Quente, 2013). Ou seja, adeus bond girls na forma como conhecíamos até aqui.

Não, eu não estou dizendo que Bond deveria ser apresentado como um anti-herói cafajeste de filme noir. Não, não é isso. Entendo a necessidade de readaptar o personagem ao mundo contemporâneo, apenas acho que não era preciso pesar tanto a mão na construção deste "homem desconstruído", na linha "me perdoe por ser homem", pois tudo soa muito artificial devido a tal exagero politicamente correto.


Quanto aos demais personagens da trama, Rami Malek (Bohemian Rhapsody, 2018) não mostrou a que veio e, portanto, não me convenceu como vilão, apresentando uma atuação morna e caricata, talvez por acreditar que sua aparência física, digamos assim, exótica, iria por si só resolver tudo. Ledo engano.


A bela atriz cubana Ana de Armas (Bata Antes de Entrar, 2015) é puro carisma. Pena que apareça tão pouco tempo em cena. Poderia ter sido bem melhor aproveitada e render uma bond girl de primeiríssima, mas, pelas razões expostas, tudo ficou apenas na promessa.

Apesar da já citada boa cadência narrativa, há alguns furos evidentes e também algumas situações muito previsíveis e, ao mesmo tempo, pouco verossímeis no desenrolar da trama. Embora eu confesse não simpatizar lá muito com Daniel Craig como ator, reconheço que ele está atuando bem, pena que seja tão prejudicado pela necessidade de "lacrar" dos produtores, nos entregando um James Bond assexuado, insípido e asséptico naquela que é, aliás, a possível despedida definitiva do velho personagem (fato que está subentendido no filme). Mas, ainda que Bond, enquanto arquétipo de diversas gerações, não desapareça por completo e sobreviva à saída de Mr. Craig da franquia, uma coisa é fato incontestável: o astro britânico realmente merecia um desfecho melhor.

Méritos técnicos à parte, 007 - Sem Tempo Para Morrer, em termos gerais, decepciona e muito.






A POLÍTICA COMO TRAGÉDIA (OU TERROR)



por Ricardo Corsetti


Ao assistir a produção guatemalteca A Chorona, impossível não traçar automaticamente um paralelo com a contemporânea tendência de ascensão ao poder da nova extrema-direita, em praticamente todos os continentes.

Filme eleito para ser o representante da Guatemala na última edição do Oscar, narra com muita competência a história fictícia, mas absolutamente verossímil, de um general hoje aposentado, mas que no passado teria sido responsável por um autêntico genocídio da população guatemalteca de origem indígena, sob o argumento de pretendia "melhorar a raça de seu povo e também combater o comunismo".


Impressionante ver o quanto esse discurso de um fictício líder político se faz presente nas falas e atitudes de políticos reais. E ,detalhe: não só de ditadores que tomam o poder à força, mas também no discurso de líderes democraticamente eleitos, como foi o caso recente de Trump, por exemplo.


Chega a ser tragicômico constatar o quanto o manjadíssimo e já caquético discurso de "vamos limitar as liberdades individuais, visando combater o comunismo", de tempos em tempos, ressurge com tudo no discurso de novos candidatos a líderes políticos.



Mais escabroso ainda é o discurso de "melhoramento da raça" ou de "limpeza". E, infelizmente, basta relembrar o ocorrido na ex-Iugoslávia, em meados dos anos 90, para vermos o quanto esse discurso de matriz claramente nazista renasce ao longo da história da política internacional.

Mas, voltando ao filme propriamente dito, o diretor estreante Jayro Bustamante conduz a trama com muita habilidade e duração enxuta (apenas 1h37min). Utiliza planos longos e movimentos discretos, associado a uma bela fotografia, para contar essa trágica história de matriz familiar, apresentando a problemática família do general Enrique (Julio Diaz), mas que acabou afetando os destinos de toda uma nação.


A Chorona somente peca no desenvolvimento da subtrama de terror, baseada numa velha lenda (crendice) latina acerca de uma jovem mulher (falecida) que viria buscar e afogar os filhos de outras famílias para vingar a morte de seus próprios filhos no passado.


Essa subtrama é apresentada e desenvolvida de forma confusa, embora não chegue a prejudicar a força e eficácia do drama familiar em que se ampara a história principal do filme.


Tecnicamente bem realizado e com história contundente, A Chorona, apesar de alguns pequenos deslizes na inclusão da mencionada subtrama, sem dúvida tem força e vigor suficientes, para justificar sua recente indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro no ano passado.








O IMPRESCINDÍVEL PAPEL DA MÚSICA EM NOSSAS VIDAS



por Ricardo Corsetti


Confesso não ser um grande fã de filmes musicais e até vê-los com certa desconfiança de início. Mas, volta e meia surge uma bela surpresa, como é o caso de No Ritmo do Coração, para me fazer rever conceitos em relação ao gênero.

Filme ultra-simpático e que emana alto astral, gira em torno da história da garota vivida (com muito talento, aliás) por Emilia Jones (A Casa do Medo, 2018), que sonha ser cantora e, paradoxalmente, é filha de pais surdos-mudos. Seu inegável talento para a música esbarra no receio de, mesmo sem querer, acabar se afastando de seus afetuosos e divertidos pais, e também de seu irmão mais velho (também surdo-mudo).


Típica trama que envolve superação, bastante característica do cinema norte-americano de viés mais comercial, mas que, graças à habilidade narrativa da experiente diretora/roteirista Sian Heder (Tallulah, 2020), jamais cai no lugar comum do sentimentalismo barato. Pelo contrário, sendo conduzida com muito senso de humor e doçura na medida certa.


Destaque para o divertido professor de música, vivido pelo ótimo ator mexicano Eugenio Derbez (Como se Tornar um Conquistador, 2017), com toda aquela afetação e falso senso de superioridade que normalmente caracterizam os típicos artistas frustrados.



No Ritmo do Coração investe no - hoje extremamente em voga - discurso de inclusão e aceitação das diferenças, mas, felizmente, o faz sem panfletarismo ou qualquer tipo de engajamento militante desnecessário. O filme é puro entretenimento informativo, realizado com muito charme, senso de humor e competência.


Destaque também a excelente trilha-sonora, recheada de clássicos da música pop, folk e também da maravilhosa soul music norte-americana.




Search By Tags
  • Facebook Classic
  • Twitter Classic
  • Google Classic
Featured Posts
Follow Us
bottom of page